O índice S&P 500 atualmente apresenta uma concentração excepcional de valor de mercado em poucas empresas. As 10 maiores companhias do índice respondem por aproximadamente 35% a 40% da capitalização total.
Esse nível é superior ao registrado no auge da bolha das empresas de tecnologia em 2000, quando as 10 principais ações chegavam a cerca de 27% do índice.
Em outras palavras, o mercado americano hoje está fortemente focado em um punhado de gigantes, principalmente do setor de tecnologia.
Essa hipercorrelação levanta preocupações: estarão essas empresas supervalorizadas?
A situação lembra períodos de euforia, sugerindo a possibilidade de uma bolha de preços.
Investidores que aplicam no S&P 500, buscando diversificação entre 500 empresas, acabam expostos desproporcionalmente a esse grupo restrito de ações.
Na prática, investir no índice tornou-se quase um sinônimo de apostar nas gigantes de tecnologia e em sua continuidade de alta.
Isso evidencia tanto a confiança do mercado nessas poucas empresas quanto um risco latente: se algo abalar a performance ou as perspectivas desses líderes, todo o índice poderá sofrer.
Para entender por que a valorização dessas ações pode persistir em níveis tão altos, mesmo com investidores racionais, é útil recorrer ao modelo de expectativas racionais e bolhas especulativas proposto por Samuel Banner.
Samuel Banner, em seu modelo de expectativas racionais e bolhas especulativas, argumenta que mesmo agentes racionais podem contribuir para a formação e manutenção de bolhas de preços.
Diferentemente da noção de “irracionalidade” dos investidores, o modelo pressupõe que todos agem de forma informada e lógica.
Então, como surge uma bolha?
Segundo Banner, isso ocorre quando os participantes do mercado acreditam que conseguirão vender o ativo no futuro por um preço ainda mais alto.
Nessas circunstâncias, um ativo pode ficar sobrevalorizado em relação aos fundamentos econômicos (como lucros, receitas ou valor patrimonial) sem que os investidores estejam “loucos”.
Pelo contrário, trata-se de uma estratégia racional dentro de certas expectativas: se todos pensam que haverá sempre um comprador disposto a pagar mais adiante, torna-se lógico segurar (ou até comprar mais do) o ativo hoje, mesmo reconhecendo que o preço atual excede o valor intrínseco.
Essas expectativas acabam sendo auto-realizáveis enquanto persistirem: o simples fato dos investidores acreditarem na alta contínua faz com que continuem comprando, alimentando a elevação de preços.
Assim, a bolha especulativa se sustenta racionalmente por algum tempo.
Somente quando a crença generalizada no aumento futuro desaparece é que a bolha estoura, ou seja, quando os agentes coletivamente deixam de esperar revender com lucro, eles recuam, e o preço cai bruscamente em direção aos fundamentos.
Em resumo, o modelo de Banner descreve um cenário de “exuberância racional”: não é necessário que haja ignorância ou euforia irracional para um ativo atingir preços exagerados.
Basta que haja confiança na revenda lucrativa futura.
Esse conceito ajuda a explicar situações de mercado em que preços permanecem elevados por longos períodos, mesmo sob escrutínio de analistas e investidores experientes.
Aplicando a teoria de Banner ao caso atual do S&P 500, podemos interpretar a ascensão vertiginosa das big techs e sua dominância no índice como uma forma de bolha especulativa racional.
Muitos investidores reconhecem que ações como Apple, Microsoft, Amazon, Alphabet (Google), Nvidia, Tesla e Meta (o chamado “clube das gigantes”) estão sendo negociadas a múltiplos altos, refletindo expectativas otimistas de crescimento futuro.
Ainda assim, a demanda por esses papéis permanece intensa.
Por quê?
Segundo a ótica das expectativas racionais, os participantes do mercado continuam comprando ou mantendo essas ações porque acreditam que no futuro haverá compradores dispostos a pagar preços ainda maiores.
Diversos fatores reforçam essa crença: o histórico de inovação e lucros crescentes dessas empresas, a ideia de que elas “sempre sobem no longo prazo”, a liquidez abundante do mercado nos últimos anos e a mentalidade de “comprar na baixa” que recompensou quem apostou nas recuperações passadas.
Mesmo os investidores conscientes de que os valuations estão esticados podem julgar mais arriscado ficar de fora do que dentro, afinal, se a alta prosseguir, quem vendeu cedo perde ganhos significativos.
Esse comportamento coletivo impulsiona os preços para cima de forma auto-reforçadora: quanto mais o valor de mercado dessas empresas cresce, maior seu peso no índice e mais gestores passivos ou seguidores de tendência compram suas ações, prolongando o ciclo.
Vale notar que há fundamentos positivos por trás dessas empresas, elas são altamente lucrativas e líderes em seus setores.
Isso dá uma legitimação parcial à alta de preços.
Porém, sob a lente do modelo de bolha racional, o preço pode ter se desconectado dos fundamentos, ao menos em parte, guiado por expectativas de valorização contínua.
Em outras palavras, o mercado pode estar precificando não apenas os lucros reais dessas companhias, mas também a crença de que “sempre haverá outro investidor disposto a pagar mais”.
Essa dinâmica explica como a concentração chegou a níveis inéditos: os ganhos dessas ações se retroalimentam pela confiança do mercado, não apenas por métricas tradicionais.
A interpretação acima não implica que a situação seja sustentável indefinidamente, apenas explica por que pode persistir por um período prolongado.
Sob um prisma objetivo, essa concentração extrema representa um equilíbrio instável.
O modelo de Banner sugere que, enquanto todos confiarem na continuidade da alta, a bolha racional permanece inchada.
Contudo, basta uma mudança no sentimento para romper o ciclo:
por exemplo, surpresas negativas nos resultados, alta de juros encarecendo o crédito, ou mesmo um choque regulatório sobre o setor de tecnologia poderiam abalar a convicção de que essas ações continuarão valorizando.
Se os investidores começarem a duvidar que encontrarão um comprador futuro a um preço maior, a premissa racional para segurar ativos sobrevalorizados desaparece.
Nesse ponto, muitos venderão simultaneamente, e a correção tende a ser severa, afinal, preços sustentados principalmente pela crença coletiva caem rapidamente quando essa crença se desfaz.
Para o investidor, isso significa que o risco de queda concentrada é significativo.
Como as 10 maiores ações dominam quase metade do S&P 500, uma desvalorização acentuada nelas contaminaria todo o mercado.
A lição do modelo de bolha racional é dupla:
por um lado, ajuda a entender por que a valorização das big techs pode ter ido além do justificável sem que os agentes sejam “irracionais”; por outro, lembra que tal valorização depende criticamente das expectativas de todos continuarem alinhados.
Os preços dessas gigantes permanecem elevados não por ingenuidade dos investidores, mas porque existe uma crença compartilhada de revenda futura lucrativa.
Isso criou um círculo virtuoso (ou vicioso) de alta, no qual a forte concentração se alimenta das próprias expectativas otimistas.
Entretanto, essa situação configura um equilíbrio delicado: qualquer abalo na confiança coletiva poderá desencadear uma correção abrupta.
Não estou afirmando que estamos diante de uma bolha, inclusive, espero sinceramente que não seja o caso.
Mas, independentemente disso, é fundamental que o nosso portfólio esteja sempre preparado para eventos desse tipo.
Um portfólio bem construído não prevê o futuro, mas se antecipa aos riscos.
Se houver uma correção, ele oferecerá proteção.
Se não houver, a vida segue e a performance continua sua trajetória com naturalidade, sem grandes sobressaltos.
Essa é a essência de uma boa gestão: estar pronto para o inesperado sem abrir mão das oportunidades do presente.
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